15 abril 2010

A (longa) história do Terminal de Contentores de Alcântara

Sem juízos de valor ou comentários a possíveis interesses ou favores, aqui fica um resumo do enredo do Terminal de Contentores de Alcântara, desde 2008 até aos dias de hoje. Vou tentar não me alongar, a história dá pano para mangas...

Meados de 2008

Eduardo Pimentel, presidente da Liscont (empresa do grupo Mota Engil) afirma que o alargamento do Terminal de Alcântara é necessário, tendo em vista a amortização do investimento. Pretende-se triplicar a capacidade do terminal, num investimento previsto de 226 M €. A Administração do Porto de Lisboa garante ser de todo o interesse atender às necessidades portuárias da capital. O Movimento e o Sindicato dos Estivadores dizem que “as pessoas percebem muito pouco da importância económica do projecto”, que classifica como “coerente”.

A população manifesta-se (Movimento “Lisboa é das pessoas, mais contentores não”, apoiado por Miguel Sousa Tavares). Toda a oposição se afirma contra o investimento (à excepção do CDS-PP, sem uma posição clara). A oposição camarária de Lisboa encontra-se em bloco contra o alargamento do termina. Manuel Alegre questiona o Governo, tenta averiguar opiniões acerca do impacto ambiental e chega até a escrever a letra para uma música (“Fado dos Contentores”, dsponível em http://cidadanialx.blogspot.com/2009/03/fado-dos-contentores.html).

Finais de 2008 - Meados de 2009

O contrato de renegociação é assinado por Mário Lino. A APL garante que a concessionária está a financiar mais de metade do projecto. Sussurra-se que as projecções quanto à capacidade do porto de Lisboa podem não ser realistas. O Tribunal de Contas opina contra o projecto e o Governo apressa-se a contra-argumentar.

Finais de 2009

O PSD avança com um primeiro projecto-lei para revogar o contrato de concessão do terminal de contentores de Alcântara ao grupo Mota Engil. O Bloco prepara-se para seguir as pisadas do PSD, os comunistas pedem o regresso da gestão do porto de Lisboa ao sector público e o CDS-PP, mais suave, vai analisando a situação.

Actualmente

Está em cima da mesa a revogação/suspensão do contrato de renegociação da parceria do Estado com a Liscont - em discussão no Parlamento, conta com projectos de toda a oposição, sendo que o PS apenas admite viabilizar o do CDS-PP (sempre mais suave, pelo menos neste assunto), que prevê a renegociação do contrato, acautelando uma possível (grande) indemnização que adviria da resolução do mesmo. Por outro lado, no fim do mês passado, a Secretaria de Estado do Ambiente emitiu (finalmente) uma declaração de impacto ambiental “favorável, condicionada à necessidade de obter autorização para ocupação das áreas abrangidas pelo regime transitório da Reserva Ecológica Nacional".

Os factos e as perguntas

De acordo com esta tabela, percebemos que o TCA funciona abaixo do previsto no caso-base do contrato original pelo menos desde 2008. Os sussurros de 2009 deveriam ter-se feito ouvir (valeriam de alguma coisa…?). A pergunta é se seria desde já necessário proceder ao alargamento. Porque não esperar por 2015, altura em que o contrato de concessão terminaria e, aí, dar lugar a um Concurso Público, de forma clara, transparente, legal e que permitisse ao mercado funcionar de acordo com a concorrência exigível num negócio que envolve o sector público e montantes tão elevados?

Contrariamente ao previsto em 2008, o investimento global ascendeu a 474,4 M €, dos quais em princípio caberiam cerca de 40% ao sector público. Digo em princípio pois, na realidade, o contrato estipula que 70% do investimento da Liscont é recuperável sob a forma de isenção de taxas não cobradas pela APL. Assim, assenta sobre o sector público, em termos líquidos, cerca de 52% do valor total investido.

Além disto, o Estado acordou suportar o risco de tráfego, riscos financeiros e o Risco de reembolso de capitais accionistas, em caso de resolução do contrato. Finalmente, e não entrando em mais detalhe pois não me parece necessáro fazê-lo para expressar a ideia essencial, a TIR dos accionistas subiu cerca de 3 pontos percentuais só ao longo so processo de negociação (entre Abril e Outubro de 2008), treminando em 14%. A questão é: sabendo que a TIR deve premiar o risco assumido pelo sector privado e que esse risco diminuiu tanto face ao contrato original como durante todo o processo de negociação, porque terá esta aumentado? E porque não recorreu o Estado ao know-how da Parpública e do MOPTC? Não querendo “meter o bedelho”, quer-me parecer que os montantes em causa justificavam algum saber de experiência feito na sua contratação.

O Tribunal de Contas alertou. A população também, tal como toda a oposição, de uma forma ou de outra. O contrato foi assinado, o mal está feito. A única questão pertinente prende-se, pois, em saber como vai o Governo lidar, agora, com a situação, tendo em conta que, voltando atrás, pelo menos de uma indemnização não se livrará – será que é desta que fazemos uma análise custo-benefício bem feita?

Talvez tenha servido como lição.





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