15 novembro 2011

FP

Aos 14 decorei um poema de Fernando Pessoa que sei até hoje.

Não sei quantas almas tenho.

Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem achei.

(...)

Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Na altura fiquei fascinada com a clareza da exposição de uma dúvida que me começava a atormentar: que raio era ser “eu própria”, afinal? Sabia que o certo era ser genuína. E ainda hoje é essa a característica que mais admiro nos outros: a ingenuidade, a personalidade genuína que algumas pessoas conseguem manter, independentemente de tudo.

Mas e quanto a mim? Que genuína? Conseguia, e consigo, pensar em mim de mil formas diferentes. Imaginar-me na mesma situação de mil maneiras diferentes, todas verdadeiras. Sonhar mil vidas distintas que gostaria de viver. Mais: viver de mil formas diferentes, agir de mil formas diferentes, todas minhas, todas reais. Adoptar mil estilos, mil personalidades, mil crenças, mil conjuntos de características, todos eles diferentes, todos eles perfeitos. Qualquer um deles. A verdade é que desde cedo houve muitos “eus”. Cresci e cada um deles cresceu comigo. Um nota-se mais hoje, sonho com o outro amanhã e não é de todo possível simplesmente escolher um, para sempre. No dia-a-dia vou optando ou cedendo, reconhecendo-me ou não, mudando ou não, querendo ou não ser o que sou, arrependendo-me ou não do que fui. Analisando. Ajustando-me. Às pessoas, aos locais, ao que me exigem, ao que acho certo ou errado ou ao que quero que pensem. Em cada momento. É conforme. E é tão assustador como genial. Como a clareza louca de Fernando Pessoa. Não é falsidade nem falta de coerência... sou eu. Tudo isso. E, tal como pareceu acontecer com FP e possivelmente acontece com muitos de nós (excepção para os genuínos que frisei em cima), continua a existir este eu que assiste ao que se passa. Este parece ser sempre o mesmo. Menos mal.

31 outubro 2011

(Re)Conhecer.

Nem falo nos outros. Quem se conhecer a si próprio, melhor, quem se reconhecer a si próprio há-de conseguir o que quiser. Conhecer, reconhecer no verdadeiro sentido das palavras, ou em todos os sentidos que tenham e possam vir a ter. De verdade. Cada segundo de cada sonho, cada intuito obscuro de cada acto. Cada cinismo, cada inveja, cada orgulho. Cada aspiração, todas as ambições. (Re)Conhecer o mais ínfimo pormenor. Os porquês, cada palavra, cada pessoa que nos levou a querer, a sentir, a crer, a fazer, a sofrer. Cada consequência e cada sequência de sentimentos e de vivências que nos tornaram no que somos. Cada reacção e cada raiva. Cada amor, a razão dos amores, a razão de os esquecermos. Ou não. Cada objectivo. Cada ressaca, de tudo. E como ultrapassámos, e como não ultrapassámos. E porquê. Quem ajudou e a quem agradecemos. E porquê. Os remorsos. Os sapos. Os príncipes e as vezes que engolimos em seco. E as opções. Os ressentimentos. As escolhas, os motivos das escolhas, o resultado das escolhas. Os obstáculos. As metas. Os pensamentos, os semi-pensamentos, as fugas. Todas as fugas. A ansiedade das primeiras vezes, em tudo. Nós, Borboletas no estômago. E como as mantivemos. E porque as afastámos. As vitórias. Justas ou não. Merecidas ou não. E quanto gostamos de nós e quanto gostamos que gostem e porquê. O presente. Os desejos e as rezas ao fim do dia. O bem e o mal que desejamos, a nós e a todos. E a tudo. E porquê. Tudo. Honestamente. Quem se reconhecer a si próprio, sabe liderar-se a si próprio. E ganha a si próprio. E há-de conseguir tudo o que quiser.


GMT

Podia ter qualquer coisa a ver com fusos horários, mas não... É uma sugestão. Aliás, uma grande sugestão: 

Gonçalo M. Tavares.

Comecei agora: "Se quiser números, podemos brincar aos números: a felicidade individual de um dia depende, vá lá, 70% da eficácia material das máquinas. Que a felicidade invisível esteja submetida a uma felicidade concreta, a uma felicidade de materiais em diálogo, de peças metálicas que encaixam umas nas outras e resolvem problemas fazendo determinadas tarefas, como tal pode parecer estranho; mas é o século. Ser feliz já não depende de coisas que vulgarmente associamos à palavra Espírito. Depende de matérias concretas. A felicidade humana é um mecanismo."

25 outubro 2011

... 99% ?







Fotografias de 16 de Outubro

Acredito piamente que estes 99% são menos do que gostariam e que o 1% que sobra é bem maior do que se faz perceber. Esta suposta minoria tem a noção da situação em que estamos e de como cá chegámos. Sabe que o exemplo das forças políticas tem sido o pior e que aproximadamente 100% dos portugueses souberam adoptar e aplicar tal exemplo de forma estupenda. Sabe que há culpas maiores e menores mas que no fundo, actores ou cúmplices, somos todos culpados. É o Estado que paga ao Estado e o Estado somos todos. Decidimos democraticamente os maus caminhos que quisemos seguir, ganhámos todos mais do que devíamos, pagámos todos menos do que devíamos. Como aconteceria em qualquer casa, temos uma dívida. 100% de nós. E caso não paguemos o que devemos acontece o que aconteceria, mais uma vez, em qualquer casa – o financiamento termina, os juros aumentam, as prestações acumulam-se, a confiança desaparece, abrimos falência. Vivemos com o que temos em casa.

Estou a dispersar-me. A minha mensagem é que existe uma parte da população que, embora não faça tanto alarido, tem conhecimento e opiniões formadas. Sabe que não poderíamos continuar como estávamos, que não podemos de forma alguma voltar atrás e que a solução tem que passar por uma série de ajustamentos, essencialmente ao nível das remunerações reais vs produtividade. No curto prazo, a alternativa ao ajustamentos dos salários, tendo como fim o aumento urgente da competitividade, é despedir pessoas. Não há outra forma de aumentarmos a competitividade com a urgência necessária se não aumentarmos a produtividade, e no curto prazo em que temos que agir só há uma forma de o fazer: cortar nos custos de produção. Ou ajustamos os salários ou o número absoluto de trabalhadores.

Esta suposta minoria sabe apesar de podermos sempre redistribuir os ajustamentos, de forma mais ou menos justa, estes não podem deixar de existir. E sabe, portanto, que o caminho que estamos a iniciar é um caminho sem alternativas viáveis possíveis. E sabe que a melhor maneira de o transformar num caminho efectivamente acertado é ajudando na construção de soluções, discutindo ideias e sugestões e, essencialmente, participando na reconquista da confiança do exterior. A confiança dos nossos credores e possíveis futuros financiadores, tal como de investidores e potenciais investidores, e tal como de grande parte dos talentos que temos no país, depende do Estado, de todos. E o Estado depende em grande parte de todos eles.

Os 99% que descrevi acima, fazem o que se vê. Estão à rasca, dizem eles. Perdoem-me, à rasca estamos todos. Entretanto, se somos ou não rascas, este é o tempo de decidirmos. Individualmente e no todo. Todo o Estado. Portugal.

20 outubro 2011

Gosto...

Gosto de pessoas com sonhos. Não os sonhos comuns que sonhamos e esquecemos, mas sim os sonhos que comandam a vida. É necessária uma boa dose de inocência para deixar a vida nas mãos dos sonhos. Ou levar a vida de acordo com os sonhos. Fazer dos sonhos objectivos. Não falo da inocência ignorante mas sim da inocência em acreditar que é possível... é possível fazer mais, querer mais, os sonhos são possíveis. A felicidade é possível.

Gosto de sonhos. E de inocência. E de pessoas, felizes.

11 outubro 2011

... poderia ser uma nota

Humanos.

Concordo (com o Nuno), somos os animais mais interessantes do Mundo. Somos, no entanto e antes de mais... animais. E, como animais, tal como todos os outros de todas as outras espécies, nascemos com uma série de características intrínsecas ao que somos. Gostamos de ter o que queremos, quando e onde queremos, e só estamos dispostos a abdicar disso se houver outro animal (maior!) que se atravesse no caminho.

Em segundo lugar, porém, somos racionais. A razão torna os outros importantes, e torna as coisas dos outros medidas de comparação. Em suma, e sem mais nada, somos animais racionais egoístas e egocêntricos, vaidosos e narcisistas, orgulhosos e invejosos. Por natureza!

Televisão.

Não há dúvida que a televisão é o meio de comunicação por excelência. Não se põe qualquer questão ao poder que têm sobre as pessoas. Melhor e mais rapidamente que qualquer outro meio ou instrumento em que se possa pensar ou inventar, com certeza a televisão consegue mudar mentalidades, personalidades, ambições, modas, desejos, costumes, morais.

Numa linha direita de raciocínio, seria então normal e directo que a televisão fosse utilizada de forma a influenciar positivamente tudo o que pode influenciar.

No entanto, não é o que acontece. E a TVI tem mais audiência que a RTP. E os melhores trabalham na TVI, a publicidade é mais cara na TVI, toda a gente vê a TVI porque a TVI explora a vida das pessoas, porque apela ao ódio, à pena, ao medo, à repugnância, às lágrimas, porque nos faz sonhar com as “notícias” que transmite. Porque aposta em dar ênfase a tudo quanto é desgraça. Porque publicita tudo quanto é amoral e o trata como normal. E pronto.

(A quem considerar injusto falar da TVI – ou apenas da TVI – mil perdões.)

Incentivos

Gosto de pensar que tudo o que acontece é consequência de um conjunto de incentivos. E é-me mais fácil expôr o que penso se o fizer através de uma análise dos incentivos que causam e que deviam causar o que quer que seja.

Ora bem, pensando num canal televisivo enquanto empresa que precisa de share porque precisa de dinheiro, e porque quanto mais share conseguir mais e mais cara publicidade terá, e tendo em conta que dinheiro cria dinheiro e que tudo isto é um ciclo, em que programas devemos apostar? Nos programas que cativem os humanos que analisámos em cima.

Ora bem, estes humanos que descrevi, seres de instinto e cobiça e vaidade, sabem de cor a vida da Lili Caneças e os nomes de mil personalidades (?), mas não sabem quem é o ministro da economia. Compram revistas para ver as rugas da Cinha Jardim mas não gastam dinheiro em livros para os filhos. Têm mais orgulho no carro que na família. Estes humanos vão para o café explicar aos mais novos como enganam as mulheres (eu sei, porque vi). Criticam para se auto-elogiarem e atiram pedras aos telhados dos outros porque não se lembram do vidro com que construíram os seus.

É a estes humanos que os programas de televisão têm que agradar, porque são eles que indirectamente lhe pagam os ordenados e os motoristas e as festas.

Conclusão

Associando a os incentivos que temos aos humanos que somos, eis que surgem programas como a Casa dos Segredos. E faz todo o sentido do ponto de vista lógico.

Escolheram a dedo os concorrentes (já deixei de acreditar que são apenas bons actores!), que ficam contentes por aparecer, ganhar fama e dinheiro fácil e por se divertirem uns com os outros – à maneira deles.

Em casa, uns ficam presos ao ecrã e admitem o vício. Ganham carinho a uns e raiva a outros e vivem a vida deles porque é mais interessante (?) que a sua.

Outros dizem que não gostam e que só vêem para ver a vergonha que é e conhecer as pessoas que temos. E criticam as mulheres e os homens e mostram como são tão superiores a eles todos e como nunca participariam num programa assim – a verdade é que houve 8000 que efectivamente tentaram! É este grupo que inventa anedotas que comparam gente a mobília... e na realidade é este o grupo que mais contribui para o preço da publicidade na TVI. Louvados sejam.

Continua, depois, a haver grupos que não vêem nem conhecem porque não têm tempo. E grupos que têm vergonha de ver – ou porque são mais velhos, ou porque têm filhos, ou porque são mais conservadores. Destes, claro, muitos veriam se pudessem.

Bem, e a verdade é que não Documentário que tenha sequer hipótese de entrar no ringue da Casa dos Segredos! E portanto é a Casa dos Segredos que passa diariamente (em horário nobre, correcto?) na TVI. E é isto que os portugueses vêem depois de jantar. E dada a influência que a televisão tem, não preciso acrescentar mais nada... tudo é um ciclo.

Nota

Houve um tema no qual não toquei quando falei em seres humanos e que de alguma forma influenciou tudo o resto – a educação. A civilização.

Acontece que além de animais racionais somos seres civilizados, somos seres sociais e educados, com morais e costumes mais ou menos enraizados. É essa educação que substitui o animal maior quando se fala em instintos. É essa educação que altera a lógica automática incentivo – acção.

Porque temos irmãos e filhos e amigos. E a educação ensina o respeito e a compaixão e as regras sociais. E porque queremos todos ser melhores e mais felizes. Porque e a cultura e a aprendizagem importam.

(...)

Enfim, a verdade é que não escrevi sobre isto porque não fez falta. Tentei encaixar o tema, mas não fazia sentido. A realidade define-se perfeitamente com a lógica descrita. Possivelmente esta nota é mesmo só uma nota. Ou menos. Uma “poderia ser” uma nota. Ou a abertura de uma excepção que não tem importância para estar no corpo do texto.


* As minhas desculpas ao Nuno por repetir o tema... não resisti! :)

deste modo ou daquele modo

Deste modo ou daquele modo,
Conforme calha ou não calha,
Podendo às vezes dizer o que penso,
E outras vezes dizendo-o mal e com misturas,
Vou escrevendo os meus versos sem querer,
Como se escrever não fosse uma cousa feita de gestos,
Como se escrever fosse uma cousa que me acontecesse
Como dar-me o sol de fora.

Procuro dizer o que sinto
Sem pensar em que o sinto.
Procuro encostar as palavras à ideia
E não precisar dum corredor
Do pensamento para as palavras.
Nem sempre consigo sentir o que sei que devo sentir.
O meu pensamento só muito devagar atravessa o rio a nado
Porque lhe pesa o fato que os homens o fizeram usar.

Procuro despir-me do que aprendi,
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro,
Mas um animal humano que a Natureza produziu.

E assim escrevo, querendo sentir a Natureza, nem sequer como um homem,
Mas como quem sente a Natureza, e mais nada.
E assim escrevo, ora bem, ora mal,
Ora acertando com o que quero dizer, ora errando,
Caindo aqui, levantando-me acolá,
Mas indo sempre no meu caminho como um cego teimoso.

Ainda assim, sou alguém.
Sou o Descobridor da Natureza.
Sou o Argonauta das sensações verdadeiras.
Trago ao Universo um novo Universo
Porque trago ao Universo ele-próprio.

Isto sinto e isto escrevo
Perfeitamente sabedor e sem que não veja
Que são cinco horas do amanhecer
E que o sol, que ainda não mostrou a cabeça
Por cima do muro do horizonte,
Ainda assim já se lhe vêem as pontas dos dedos
Agarrando o cimo do muro
Do horizonte cheio de montes baixos.

Alberto Caeiro

06 outubro 2011

xiuuuu!

Percebo, e não percebo, este desinteresse interessante pelo (dizem), programa de tv mais mediático da actualidade.
Há sempre os que dizem que não gostam, e não gostam. Os que dizem não gostam e gostam. E os outros. Eu faço parte dos outros (principalmente porque não tenho tido oportunidade de ter esse canal à minha disposição).

Uma coisa é certa: Se o animal mais interessante à face da terra é o Homem, a possibilidade de isolar não-sei-quantas pessoas numa casa, e estudá-las, devia ser um assunto com muito mais (de, extraordinário) interesse.
Por isso, tu, que gostas de animais, em vez de perderes tempo com National Geographic sintoniza masé o Secret Story.

Nota: Senti-me obrigado a escrever qualquer coisa depois da Carina ter aparecido (uma série de meses depois), e ter escrito logo uma coisa que dá que pensar :) Fiquei longe, e em género de brincadeira, mas a verdade é que ainda conseguia arranjar alguns argumentos para que se pudesse pensar no assunto (provavelmente não nos moldes actuais, mas até isso podia ser motivo de interesse).

05 outubro 2011

É isto.

Se tivesse nascido loira, talvez pintasse tanto o cabelo de castanho como o tenho descolorado nos últimos tempos. Se morasse ao pé do mar, havia de me incomodar tanto a humidade como me incomoda a poluição de Lisboa. E acredito que se ganhasse o euromilhões talvez me incomodassem as dúvidas relativamente aos interesses de quem se aproximasse de mim, tal como hoje me incomoda ter que controlar o saldo da conta bancária. Voltar a ter férias de três meses e meio provavelmente deprimiria-me mais do que o desejo de alongar os dias para poder descansar depois do trabalho. E se a minha casa fosse maior suponho que me chatearia o tempo que havia de passar a arrumá-la, como me chateia agora não ter espaço para convidar dez amigos para jantar.


(...)

E se tudo fosse igual ao melhor sonho de hoje, na verdade o mais certo era estar bem menos satisfeita do que estou agora.

E, visto isto, suponho que tenho que passar mais tempo a viver do que a sonhar.

27 maio 2011

Verbos

Gosto da cumplicidade. Do sorriso. Gosto de não pensar.
Gosto do altruísmo. Da indiferença da diferença. Gosto da loucura. Gosto do cheiro. Gosto do “tanto faz”.
Gosto de ler, sem palavras.
 Gosto da lucidez. Da lucidez do egoísmo. Gosto da saudade. Gosto de não me fazer entender. Gosto do vento de sul.
Gosto de sonhos irrealizáveis, amanhã.
Gosto da surpresa. Gosto do desafio. Gosto da perspicácia.
Gosto do olhar. Do calor. Do corpo. Da alma.
Gosto de praças com história. De estórias. Gosto de correr. De viajar. Gosto da mudança. Da simplicidade. Do desejo. Gosto do contra. Gosto de querer.
Isto é viver?

José.